Skip to main content
All Posts By

Bibiana Malgarim

NÃO É PARA CRIANÇA: Limites

Comecei a pensar sobre o tema O QUE É CONTEÚDO PARA CRIANÇA e o que NÃO É a partir de uma polêmica com o show da Mc Pipokinha (conhece?). O texto não é sobre ela porque o assunto a precede em décadas, quiçá séculos. Talvez o texto seja sobre LIMITES e o quanto eles estão borrados para nós, sociedade.

Como psicóloga especializada na área da infância escuto sistematicamente a queixa sobre até onde e de que forma se estabelece limites sobre os conteúdos aos quais as crianças têm acesso. E de fato, é um problema muito grave isso por duas razões iniciais:

  1. Há muito conteúdo disponível em várias formatos e locais
  2. Os pais estão confusos e (seguem) culpados.

Com as diversas plataformas de conteúdos que temos disponíveis, os jogos, desenhos, filmes, etc. e a cultura de que as crianças muito pequenas podem ter acesso a smartphones e tablets – e quando falo muito pequenas, são realmente pequenas, bebês! – as crianças são invadidas por uma intensidade enorme de estímulos para os quais elas não tem condição de mediar e avaliar, e o que ocorre é que elas simplesmente vão ficando excitadas pelas telas, seu humor vai ficando irritado, a memória e outros aspectos cognitivos subdesenvolvidos e assim por diante, até uma explosão sintomática. 

O que falta aqui? Limite. 

Uma criança NÃO pode ter para si de forma liberada conteúdos da internet porque ela é IMATURA para lidar com a intensidade dos estímulos e o conteúdo deles. 

E é nesse segundo ponto que entrou a Mc Pipokinha – muitos conteúdos são produzidos com características infantis, nomes no diminutivo, roupas, brinquedos, dentre outras características que remetem à infância, porém NÃO são conteúdos apropriados para crianças e quem deve mediar isso? Sim, você acertou! Os pais. 

Eu sei que é difícil, porque os celulares já viraram uma parte do corpo humano há algum tempo – você certamente está lendo isso do seu smartphone – e a questão dos limites é para todos, especialmente para quem precisa, não só dar exemplo, mas também estar presencialmente conectado com o miúdo ou miúda tão desejado e que está aí, ao seu lado.

Então, recapitulando:

Se você não permite que seu filho ou filha seja exposto a conteúdos violentos ou pornográficos na escola, por exemplo, por que permitiria dentro de casa?

Instagram é um álbum de fotos

Você tem ou já viu um álbum de fotos? 

Isso mesmo, daqueles impressos com foto de papel. Fotos reveladas, como dizem os mais velhos. 

Eu sugiro que antes de seguir neste texto, procure um álbum perto de você e veja-o. Pode servir também a opção do facebook que tem no item Fotos, os álbuns, caso você não tenha nada a mão ou nunca tenha visto um desses objetos.

Feito isso, eu pergunto: qual a sensação que você teve olhando para as fotos e as pessoas nas fotos? Que sentimentos estão registrados da forma mais eterna possível naquelas imagens impressas?

Em regra, ou, de maneira generalizada, poderemos todos responder: felicidade. 

E é verdade. As fotos registradas e impressas, ou publicadas como são atualmente, congelam em nossas memórias afetivas os momentos de felicidade, realização, amor, conquistas, dentre outros nessa mesma linha de sensações. O que elas não mostram são os outros tantos momentos da vida, os de tristeza, de decepção, de saudade, de injustiça, de medo, de traição, e por aí vai. O interessante é que ambos momentos existem, os bons e os ruins, na vida. E o fato que termos registros somente dos bons não significa que eles são a síntese de tudo, ou seja, da vida. Eles são uma parte boa, a parte que queremos lembrar e mostrar. 

O instagram é um álbum de fotos. 

Nele há registros de coisas extraordinárias, de pessoas que aparentam sucesso, de felicidade, corpos esculpidos por deuses, amores eternos, filhos que enchem seus pais de orgulho. Enfim, um álbum infinito e público do que é uma parte da vida, não é A vida. 

Se fossemos ver esse álbum com um olhar mais inteiro talvez as legendas seriam assim:

“Depois de 5 anos desempregada finalmente consegui um emprego, que não está me remunerando de acordo com minha qualificação, mas desempregada estava osso!”

“Tive uma intoxicação alimentar e nesta, entre hospital e tal, perdi 7 kg. A foto não vai contar isso, mas vai mostrar que minha barriga chapou! #tá pago”

“Foi um ano bastante difícil e acompanhei de perto meu filho na escola depois de notas abaixo da média. Ele estava muito angustiado. Hoje um presente para nós todos: um 8 na prova de história! Parabéns, filho!”

Dá para notar a diferença?

A fantasia de uma vida cheia de benesses e facilidades, normal quando somos bebês, segue viva dentro de nós e rapidamente somos capturados pelas imagens que transmitem essa mensagem porque cola com um desejo que ainda resiste à uma vida que é inteira.

Olhar o álbum com os bons momentos é uma delícia, entender que tem uma grande parte de coisas que não está lá não anula a beleza dos registros. Acreditar que só existe o “álbum” na vida é outra história.

Carta aberta ao analista

Carta aberta ao analista (do paciente para o analista)

Caro analista, 

Essa carta não é algo definitivo. Com certeza não é. Mas, é algo que gostaria de dizer a você e a algum outro que por ventura ler essa carta. Talvez somente eu pense isso, talvez não. Talvez ajude, talvez seja só uma pretensão minha – algo não analisado? Agora não saberei dizer.

Primeiro eu quero agradecer por todo processo porque devido a ele, inclusive, eu pude escrever essa carta e expressar, ainda que por escrito, sentimentos e observações que fiz nesse processo.

Caro analista, quando uma pessoa procura você e pergunta se você pode ajudar, algumas delas certamente não estão te perguntando se você vai pagar os boletos dela, ou falar por ela algo que ela não está conseguindo, ou ainda, pegar em sua mão e conduzi-la de forma cega. Ela quer acolhimento porque está doendo o que está dentro dela. Ela quer sua escuta atenta. Ela quer a ajuda de ter um lugar seguro para sentar e chorar sem ser julgada ou apressada. Ela quer alguém vivo e afetivo junto.

Quando alguém lhe disser:

“Não entendi o que você disse”, nem sempre será por conta da resistência. 

É que, muitas vezes, suas palavras são desconhecidas para pessoas que não são da área ou ainda, elas tem um sentido que não é o popular. Quando disse que “não entendi” eu quero me aproximar do que está acontecendo ali naquele momento, e não ao contrário. Quero que as palavras façam tanto sentido para mim que se tornem minhas, ou eu as sinta como minhas. Quero sentir-me entendido.

Quando eu questiono alguma norma do tratamento, meu analista, uma possibilidade que deveria ser considerada é que eu quero de fato pensar junto o que significa para nós aquela combinação e não colocar em risco nosso vínculo terapêutico. Ah, e tem outra sobre a questão do vínculo: quando, vez ou outra, eu perguntar como você está depois de alguma sessão que você desmarcou, por exemplo, eu posso ter ficado preocupado porque tem afeto nessa relação. Juro que não imagino – nem quero!!! – que você irá me contar sobre suas intimidades.

Meu analista, não quero aula na minha sessão, mas sentir que você sabe o que está fazendo é algo que transmite segurança. Não quero conselhos, nem quero que me diga “que tudo ficará bem” – porque talvez não fique – mas, sim, quero alguém próximo, humano, alguém que, errando – porque sendo humano, irá errar – não tenha nenhum problema em dizer que “pisou na bola”. Eu vou te admirar. Mais uma coisinha, dizer “não sei” é zero problema, viu? Essa pinta de quem sabe tudo, cansa bastante, a mim e certamente a ti também. 

Analista não deve ser um trabalho fácil, tenho certeza. Fico imaginando o tanto que você estudou e estuda para estar nesse lugar. Admiro tanto! 

Mas, uma coisa que aprendi com a psicanálise é que ela é afetiva e isso não a deixa menos neutra ou ética. Psicanálise é sobre a vida de todo mundo, ela se implica, ela é uma experiência que se vive a dois. Ou seja, meu analista, a Psicanálise não é cinza, sisuda e enigmática, isto é outra coisa. E se tem algo que aprendi é que, Psicanálise é sobre relação – essa poderosa experiência que nos torna humanos de verdade.Sendo assim, não me deixe sozinho na minha sessão.

E mais uma vez, obrigada!

ATENÇÃO: Essa carta é um texto ficcional.

Uma noite, ou duas…

“Uma noite não muito diferente de várias outras, junto com a comida chinesa que foi entregue na minha casa veio um biscoito da sorte: aqueles biscoitinhos interessantes e adocicados que vem de brinde. Após o jantar, abri o meu e no interior dele veio a seguinte frase:

´Acumule forças no período de ação impossível para assim realizar grandes obras.´

Essas frases, em geral, não surtem muito efeito. Soam como frases prontas, simplesmente embaladas junto a um biscoito, entretanto na conjuntura em que ela me caiu nas mãos, meus pensamentos se tornaram mais intensos em relação a ela.

Existe um momento em que a ação realmente parece impossível e dolorosamente nos aponta a inevitável impotência que o humano é obrigado a conviver. Hoje, pensei mais uma vez nessa frase, voltei a lê-la e novamente refleti sobre o que poderia implicar seu conteúdo.

Meu espírito intenso como só não consegue sossegar frente à impossibilidade de ação, a razão para isso pode ser múltipla. Pode ser porque sou assim, seja porque sempre acreditei que poderia fazer alguma coisa, ou, ainda, devido a uma crença infantil na onipotência de que as coisas dependem somente de você mesmo para acontecer (uma palavra para isso: HAHAHA!!).

Diante dessa torrente reflexiva, dei-me conta que muitas coisas foram assim até agora: desejei algo, organizei meus planos e tratei de abrir o caminho até o ponto em questão. Obstinada. Na prática, sempre levada pela impaciência e pela pressa, possivelmente passei correndo por experiências das quais poderia ter tirado mais proveito; passei por pessoas sem conhecê-las direito ou profundamente; ignorei avisos importantes; ou ainda, simplesmente fui como sei ser.

Contudo hoje, frente a um desejo crescente de estar junto a alguém importante para mim e perceber que a ação é – literalmente – impossível nesse momento, meu coração dói ao se dedicar a guardar forças. Devo crer que essa é a única alternativa, e possivelmente o mais correto a ser feito, entretanto nunca me pareceu tão difícil esperar o tempo próprio da vida.

A urgência íntima me enganou muitas vezes e, dessa forma, forças foram gastas sem critério. O que quero passar a crer de verdade é que haverá uma grande obra como diz o bilhetinho do biscoito, e que eu saberei aguardar. Por que isso aconteceria? Porque eu desejo também?

Ouço de novo a mesma voz que riu um pouco antes: Cresce e vai dormir porque amanhã é dia de trabalho.

Às vezes, as noites podem ser cruéis com o coração das pessoas.”

(Pequeno conto escrito em 2010)

Branco, branquinho

Quero começar pedindo DESCULPAS a todas as mulheres (sim, exclusivamente mulheres) que eu “enchi o saco” de forma direta ou indireta sobre seus cabelos brancos. Eu tenho vívido na minha memória eu e uma colega de trabalho falando – com indignação – por que razão mulheres não pintavam seus cabelos!

Contexto 1: A indignação que falo é típica daquela que não tinha cabelos brancos e por alguma razão se importava com quem os tinha.

Contexto 2: Essa memória é de muitos anos atrás, mais de década – perdoem minha imaturidade sobre o tema. 

Contextos colocados, retomo: me perdoem!

Hoje, eu com mais de 40 anos e com muitos cabelos brancos misturados com os castanhos remanescentes me dou conta do que eu fiz e do que se faz cotidianamente: encher o saco alheio. 

Eu não vou pegar nesse texto o caminho legítimo sobre o direito aos nossos corpos, o que incluiria nossos cabelos, mas de qualquer forma, acaba que é sobre como algumas características nossas, no meu caso o cabelo branco, acaba incomodando muito outras pessoas. 

E digo mais: incomoda a mim mesma. Quando vi o que julguei ser o primeiro não tive dúvida: arranquei. 

A cada vez que me dizem: Nossa! Quanto cabelo branco tu tá!! – e são tantas vezes que dá vontade de fazer uma mensagem automática, como nos e-mails. De qualquer forma, eu replico:

_ Pois é, eu to pensando o que fazer ainda. 

Falo isso porque realmente não sei o que quero fazer comigo, com meu cabelo, em minha defesa ou sobre meu envelhecimento. E talvez seja esse um dos pontos: acusar a velhice do outro é falar de forma projetiva do medo da sua própria perda de juventude. De todo modo, é um saco.

Eu não sei o que fazer com meus cabelos brancos.

Fato é, que eles serão maioria em breve e serão evidências incontestáveis dos anos que vivi até agora e que, sinceramente, desejo muitos ainda pela frente.

As faces da violência

“Bibiana, o que você chama de agressividade eu chamo de insistência…”

Essa frase foi enviada para mim por uma pessoa, um homem que não era meu paciente, numa situação em que ele estava em desacordo com minha conduta profissional.

Claramente, nós dois víamos a situação de formas muito diferentes: eu entendia que ele estava sendo violento verbalmente através de ameaças, ele, por sua vez, entendia que era simplesmente enfaticamente insistente (a palavra “enfática” também foi usada por ele).

O que eu quero discutir aqui?

Quero trazer um recorte do meu trabalho com crianças, do que eu vivo como mulher, do que eu leio e escuto de outras pessoas, o qual conta sobre as diferentes faces e nuances que a violência pode ter. 

Usualmente a violência mais explícita é a física, na qual as marcas no corpo são dificilmente dissimuladas, ainda que possam vir a ser. Há muitos tipos de violências, assim como há muitas nuances dela e assim, formas bastante perversas de “interpretação” do que é violento ou não. Discriminação, preconceito, homofobia, racismo, machismo, todas estas podem ser maquiadas e parecerem algo banal, ou, simplesmente, uma “insistência”. Mas, não o são. E não podem seguir sendo vistas dessa forma.

A violência psicológica, embora muito frequente, é pouco reconhecida, e, com isso, sua face não é clara para a maior parte da sociedade.
Talvez você pense: “Ah, Bibiana, agora tudo virou violência!”

Não, nem tudo é sobre isso, mas muita coisa é. E é sobre o que ainda é – e há muito, basta ver as estatísticas, caso isso seja necessário – que sistematicamente precisamos falar, pensar e, acima de tudo, mudar essa realidade.

Para fins de educação, irei utilizar algumas linhas conceituando o que é a violência psicológica:

Seu diagnóstico é bastante complexo e quanto detecta-se, frequentemente está associada a outros quadros severos de maltrato e ainda que confirmada a suspeita, a intervenção dos profissionais e/ou do sistema legal ocorre de forma mais cautelosa.

É caracterizada como hostilidade verbal crônica em forma de burla, desprezo, crítica ou ameaças. Quem maltrata psiquicamente pode adotar atitudes tais como ameaçadas indiretas, privação, humilhar frente aos outros, privar de saídas e de integração social, por exemplo.

A agressão verbal é uma das faces mais comuns da violência psicológica, e em contextos familiares, por exemplo, não raro está acompanhada da violência física. É uma forma usada para agredir uma pessoa com palavras. Usa por exemplo, xingamentos ou outras expressões que façam o outro se sentir inferior.

Com faces tão indistintas por vezes, a violência vai passando entre nós e naturalizando-se entre quem é agredido e agressores, tornando-se banal até um ponto crítico no qual eclode em uma situação fatal. Nesse ponto, a sociedade olha com pavor e pergunta-se: Como se chegou a esse ponto? É sobre isso que falo nesse texto: o processo, não o resultado trágico final.

Violência pode ter um o rosto que tiver, mas essas agressões cotidianas são corrosivas como ferrugem: aos poucos vão desmontando a coragem, a auto estima, a confiança. Sobrará o que, então?

Farei uma pergunta, do meu ponto de vista, mais esperançosa:

O que nós faremos para mudar essa face?

haverá um mês

Haverá um mês diferente. 

Haverá um mês, que mesmo anunciando a mudança de estações, estará recoberto de um outro clima, um ar mais denso, folha caída, um cinza indeciso, uma saudade.

Haverá um mês que será confuso por muitos anos.

Passa um, passa dois, passarão mais, e ele será o mês.

Nele cabe o impossível: o início e o fim. 

Nele coube o que não tem palavra até hoje.

O tempo parece que enlouqueceu.

Haverá um mês que teimamos em não querer sentir.

As marcas estão presentes e ditam que ali algo findou.

E é essa inevitabilidade que arrasa com as defesas.

Sempre haverá um mês em que não se poderá esquecer.

Não se esquece o que está tão profundo:

Como as árvores, folhas e flores e frutos não se sustentam nos passar dos meses. 

As raízes, sim. Elas seguem. E cavam mais fundo todos os anos.

Então, seguiremos raiz, mês a mês, ano a ano.

8 de outubro

não sei…

Quando eu era estudante de psicologia um dos momentos que eu mais temia era o que eu teria que assumir ou dizer: Não sei!

Um verdadeiro pavor dessas duas palavrinhas.

Especialmente pelo que eu entendia que elas representavam para mim: não saber era assumir um defeito, um problema que eu tinha, algo grave e feio. Parecia sinônimo de alguma fraqueza, fosse do meu estudo, fosse do meu empenho.

Desesperador esse não saber.

Havia treinos para evitar essa “saia justa” impensável, como por exemplo: se a banca do trabalho final de graduação perguntasse 

“Por que você não usou autor X?”, 

“Por que escolher esse tema e não o outro?”, 

“O que você pensa sobre a ideias do autor Y?”, 

ou ainda, frente a pacientes ou pais de paciente,

 “Por que isso está acontecendo?”, 

“O que ele tem?”, 

“Quantas sessões vai levar tudo isso?”. 

Perguntas e “saias justas” as quais não findaram com o término da graduação. 

Ao contrário, elas seguiram pelo mestrado, doutorado, formação, pela minha prática clínica quase diariamente. 

E o que fazer com o “não sei!”?

Com ele, nada.

Comigo, fiz bastante coisa.

Gradativamente, fui construindo dentro de mim referências sobre o que eu estudei, sobre o que eu faço, sobre o que gosto, sobre quem eu sou. Como eu digo, fui ficando confortável na minha própria pele. Estudar, se tratar, supervisionar, clássicos que não são nada clichês. Hoje, eu coloco um quarto elemento nesse tradicional tripé: viver. Isso mesmo, viver a sua vida, gratificar-se com encontros, festas, viagens, arte, amigos, amor.

O caminho vai se fazendo. O “não sei” segue nele. 

O que muda não é sobre saber ou não, é outra coisa: é se dar por conta que não se saberá tudo nunca. Óbvio? Não, realmente não. Tanto não é que, para você poder usar essa expressão é necessário sentir-se bastante seguro porque você não saberá e isso também será importantíssimo para seu trabalho e para a sua vida.

Dizer “não sei.” passa ser algo tranquilizador, e, simultaneamente, algo potente. Não é mais um demérito. 

Você pode dizer que “não sabe” porque, finalmente, você aprendeu que, em qualquer campo da vida, saber tudo, além de impossível, é intragável.

Forma certa X Forma errada de estudar psicanálise

Primeira coisa para começar esse texto: Não é sobre formação em psicanálise.

Segunda coisa, vamos ao texto!

Tem muitas formas erradas de estudar psicanálise e isso pode ser visto todos os dias. Darei alguns exemplos disso e, pode ser, que você se identifique com alguns:

ler os textos de Freud porque é obrigado;

tentar entender sozinho os textos freudianos;

perder de vista o momento sócio-histórico em que os textos foram escritos;

querer comparar psicanálise com psiquiatria;

usar jargões sobre as ideias freudianas;

não conseguir enxergar a aplicabilidade da psicanálise;

não ler as notas de rodapé.

Gente! Poderia seguir aqui com uma lista gigante com itens que vão criando um verdadeiro “ranço” de estudar psicanálise.

Eu entendo que existe uma forma certa de estudar. Pelo menos, eu achei a minha forma certa de estudar essa teoria de compreensão profunda da psique humana que é a Psicanálise.

Vamos aos fatos:

#1 Estudar é diferente de ler: Ler é um primeiro passo para quem quer estudar. Você começa lendo, depois precisará ler novamente e em um terceiro momento, você buscará suas dúvidas dentro do texto, insights e pesquisará conceitos ou palavras que você não compreendeu.

#2 Pensar: Depois que a gente começa a estudar Freud é inevitável que muitas questões irão emergir em nossa mente. Você quer entender mais e em maior profundidade porque as ideias dele são revolucionárias até os dias de hoje. E nesse ponto do estudo, em que você precisa pensar sobre, acredito que é fundamental a orientação de algumas discussões sobre os textos. Costumo chamar isso de leitura orientada, que é algo muito comum em grupos de estudos. Esse momento, mais coletivo, é um divisor de águas no processo de estudo.

#3 Ver: Com uma base teórica em construção, uma das formas que mais me agrada e me ajudou a estudar psicanálise é poder VER onde esses conceitos todos estão na nossa vida. Ou seja, exemplos práticos. Do meu ponto de vista, isso faz TODA a DIFERENÇA. E quando digo exemplos, refiro-me a eventos realmente cotidianos porque a vida é feita de pequenos momentos, os grandes são mais pontuais.

Uma queixa muito comum, que foi inclusive minha quando comecei a estudar psicanálise, é: mas onde eu vejo isso no meu dia a dia? Embora essa questão tenha várias camadas, irei abordar aqui uma delas, a qual diz respeito a uma certa elitização da psicanálise, ou seja, os fenômenos dos quais ela falava diziam respeito a uma parcela muito específica de uma população. Isso, para mim, não é verdade. E através de exemplos corriqueiros dos conceitos puder entender, me aproximar, sentir-me incluída e, ainda, motivou-me a estudar ainda mais.

E o resultado prático disso? Sentir-me uma profissional competente e ética com minha proposta de escuta clínica.

Então, tem jeito certo?

Para mim, sim!

E o que você acha disso?

A psicanálise está na vida: vou te mostrar

No fim dos anos 1800, início dos anos 1900, um jovem, ambicioso e promissor neurologista despontava com suas descobertas em uma Europa tradicional. O nome desse médico era Sigmund Freud.
Freud “brincou” que ele trouxe a praga, mas de que praga ele falava? De um conhecimento que não tem retorno: conhecer o inconsciente, logo, conhecer a si mesmo de uma forma nunca antes registrada.
A tal praga nos tira da ignorância sobre nós, sobre nossos processos psíquicos, sobre a sociedade, sobre a vida e a morte. É uma porta de entrada que só nos leva a outras novas portas – e isso é incrível!

A psicanálise originalmente poderia ser definida dessas três formas: como um procedimento para investigação dos processos mentais; um método baseado nessa investigação para o tratamento de transtornos neuróticos; e, uma série de concepções psicológicas adquiridas por esse meio e que se somam, umas às outras, para formar um disciplina científica.

A palavra psicanálise tem origem na química, significando em sentido amplo, análise de partes psíquicas. Hoje, todos esses conceitos seguem evoluindo e a psicanálise é um tratamento muito mais amplo do que foi no seu início, abarcando os mais diversos quadros de sofrimento e personalidade.

Até aqui, provavelmente pouca ou nenhuma novidade e você pode estar pensando:
Tá, mas e aí?
Onde isso tudo aparece?
Vou mostrar alguns exemplos muito cotidianos de onde a psicanálise está e você talvez não tenha percebido.

Vamos começar pela início da vida.
Quando o bebê ainda é bem pequeno e precisa muito de um cuidador devotado, o bebê não sabe que existe tudo isso em torno dele, as coisas aparecem para ele. Como por exemplo, o leite. A isso chamamos de onipotência que será um lastro fundamental para a personalidade.

Quando a criança brinca de jogar coisas para longe dela ou brinca com um adulto de sumir e aparecer (com um paninho na frente do rosto, sabe?), isso é uma aquisição fundamental para compreender, controlar e elaborar ansiedades.

E ao redor dos 4 anos em que meninos e meninas olham com deslumbramento para suas figuras parentais e desejam ser como eles e ficam tomados de ciúmes quando são preteridos? Logo, logo, ao redor dos 5 anos, irá aparecer o medo de dormir sozinho. Sabe como tudo isso se chama? Complexo de Édipo.

Imagine que você está chegando em casa depois de um dia bastante cansativo, está irritado, mas devido a sua personalidade lidar com sentimentos negativos é difícil. Então, você olha para seu/sua parceiro (a), de forma desconfiada, e diz: “Ihhhhh, você está estranho hoje!” Essa situação muito típica, é um mecanismo de defesa bastante básico. Chama-se projeção.

Você já se apaixonou pelo seu professor? Idealizou sua médica? Teve certeza que somente sua psicóloga lhe entendeu na vida? Isso acontece com todo mundo e chamamos de transferência.

Está bastante popular a expressão “síndrome da impostora”, já ouviu falar? Se não, já sentiu que se cobra muito, nada é o suficiente, ou, ainda, por mais que se esforce teme que não conseguirá? Isso soa familiar? Freud já escreveu sobre isso, e isso foi no início dos anos 1900, quando ele demonstrou os conceitos de ideal de ego e ego ideal.

E aquela escolha “errada” de parceiro ou parceira? Sabe aquela história de “sempre escolher quem te sacaneia”? Algumas pessoas chamam isso de forma jocosa de “dedo podre”. A psicanálise explica isso também? Sim, chamamos de compulsão à repetição.

Doenças que se associam a estados emocionais, conhecidas como psicossomáticas, nas quais o corpo vira palco de um estado de sofrimento ainda não nomeado e difícil de ser expresso por outras vias. A psicanálise nos mostra como ocorrem esses caminhos dentro do psiquismo dos sujeitos.

Trocou o nome de uma pessoa?
Esqueceu algo importante?
Sonha?
Desde que somos muito pequenos, até mesmo antes de nascermos, há uma história que nos permeia e conta sobre quem somos e por que razão somos da maneira que nos apresentamos. E a psicanálise não fala nada além disso:, de toda essa complexidade que envolve os dias mais banais de nossas vidas.

Abrir chat
Precisando de ajuda?
Olá, me chamo Bibiana, qual seu nome e como posso te ajudar?