Olhando para o alto, como se olhasse para um arranha-céu, enquanto caminhávamos pela calçada com uma falsa displicência, fincou suas palavras no ar:
“_ Nunca vi uma loira de cabelo preto!”
Em um primeiro momento, olhei para a pequena mão que se perdia na minha, segui pelo braço – como o braço de uma boneca grande – e cheguei ao seu rostinho miúdo. Não sabia ao certo se era para rir naquele momento. Acabei rindo da observação que soou tão peculiar e impensável para mim.
A pequena não entendeu minhas risadas. Estava na cara que não compreendia. Simplesmente o que não compreendia era a razão da graça em função da sua constatação, a qual era tão séria e pautada pela sua experiência de quase cinco anos de vida. Inevitavelmente tentei pensar o que eu nunca havia visto. Pensei tantas coisas, mas absolutamente tão lógicas e com olhos tão acostumados. Senti-me previsível de dar enjôo.
Afinal entendi: o assombro de nossos olhos diminui significativamente com o passar dos anos – o tempo não ajuda a ficarmos mais espertos ao que acontece ao redor; os olhos se acostumam como se fossem marginais à própria ignorância.
Nunca vi uma loira de cabelo preto?
Fui obrigada a concordar com ela, olhando para o rostinho que encarava fortemente minha expressão quase que perdida: eu também nunca havia visto uma loira de cabelo preto. Ou tinha?
Não ri mais.