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Violência

NÃO É PARA CRIANÇA: Limites

Comecei a pensar sobre o tema O QUE É CONTEÚDO PARA CRIANÇA e o que NÃO É a partir de uma polêmica com o show da Mc Pipokinha (conhece?). O texto não é sobre ela porque o assunto a precede em décadas, quiçá séculos. Talvez o texto seja sobre LIMITES e o quanto eles estão borrados para nós, sociedade.

Como psicóloga especializada na área da infância escuto sistematicamente a queixa sobre até onde e de que forma se estabelece limites sobre os conteúdos aos quais as crianças têm acesso. E de fato, é um problema muito grave isso por duas razões iniciais:

  1. Há muito conteúdo disponível em várias formatos e locais
  2. Os pais estão confusos e (seguem) culpados.

Com as diversas plataformas de conteúdos que temos disponíveis, os jogos, desenhos, filmes, etc. e a cultura de que as crianças muito pequenas podem ter acesso a smartphones e tablets – e quando falo muito pequenas, são realmente pequenas, bebês! – as crianças são invadidas por uma intensidade enorme de estímulos para os quais elas não tem condição de mediar e avaliar, e o que ocorre é que elas simplesmente vão ficando excitadas pelas telas, seu humor vai ficando irritado, a memória e outros aspectos cognitivos subdesenvolvidos e assim por diante, até uma explosão sintomática. 

O que falta aqui? Limite. 

Uma criança NÃO pode ter para si de forma liberada conteúdos da internet porque ela é IMATURA para lidar com a intensidade dos estímulos e o conteúdo deles. 

E é nesse segundo ponto que entrou a Mc Pipokinha – muitos conteúdos são produzidos com características infantis, nomes no diminutivo, roupas, brinquedos, dentre outras características que remetem à infância, porém NÃO são conteúdos apropriados para crianças e quem deve mediar isso? Sim, você acertou! Os pais. 

Eu sei que é difícil, porque os celulares já viraram uma parte do corpo humano há algum tempo – você certamente está lendo isso do seu smartphone – e a questão dos limites é para todos, especialmente para quem precisa, não só dar exemplo, mas também estar presencialmente conectado com o miúdo ou miúda tão desejado e que está aí, ao seu lado.

Então, recapitulando:

Se você não permite que seu filho ou filha seja exposto a conteúdos violentos ou pornográficos na escola, por exemplo, por que permitiria dentro de casa?

Nota de esclarecimento e posicionamento sobre posição do CFP até o momento (24 de setembro/2018) a respeito da Lei de Alienação Parental

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) hoje (24 de Setembro/2018) discute juntamente com profissionais da área sua posição oficial em relação á Lei da Alienação Parental, sendo que até o momento se posiciona contra a lei (https://site.cfp.org.br/cfp-recebe-especialistas-para-discutir-lei-de-alienacao-parental/) . O CFP entende, de maneira geral, que a lei não se faz necessária uma vez que existe o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), evoca algumas questões como a discriminação contra a mulher, além de questionar o lugar do psicólogo nesse panorama.

A Alienação Parental definitivamente não é um fenômeno novo, ainda que tenha sido nomeado mais recentemente, e como consequências desse fenômeno podemos observar, em alguns casos,  o que se chama por Síndrome da Alienação Parental (SAP). Alguns profissionais da área, incluindo a mim, entendem que a Lei não desabona o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e sim, poderá ser tomada como uma ferramenta complementar visto que dá conta de fenômenos de violência (psicológica ou física) que passam a ser estudadas e nomeadas no curso do desenvolvimento da nossa sociedade.

Entendo que a aplicação da lei precisa ser cuidadosa, uma vez que toda e qualquer lei pode ser subvertida em sua aplicabilidade, ou seja, a mesma poderá ser utilizada de maneira inapropriada, como tantas outras leis que nos regem. Contudo, uma escuta atenta, uma avaliação ética e um acompanhamento multidisciplinar oferece condições de indicar o que acontece entre os genitores e que envolve, na grande maioria das vezes, os filhos de maneira direta, como exemplo, a questão discutida aqui, a Alienação Parental.

Como psicóloga especializada em crianças e adolescentes, atendendo (e atendi) vários casos na minha prática diária, infelizmente testemunhando que esse fenômeno existe e gera um sofrimento muito significativo para os genitores e, especialmente, para a criança envolvida. Algumas ponderações são necessárias, tomo como exemplo  uma das questão apontadas pelo CFP: “A lei da alienação parental pode ser um instrumento para esconder a discriminação existente contra mulheres nos processos judiciais?” (https://site.cfp.org.br/cfp-recebe-especialistas-para-discutir-lei-de-alienacao-parental/). Entendo, que ainda é preciso – e provavelmente isso perdurará por muitas décadas ainda, quiçá séculos – trabalhar, resistir e lutar pela desconstrução do machismo em todos os campos da nossa sociedade, contudo, há de se fazer distinções necessárias: em se tratando de crianças, antes de qualquer movimento pré-concebido é fundamental avaliar cuidadosamente a situação, uma vez que o “mito do amor materno” perdura em posicionamentos de vários profissionais. Infelizmente, é muito frequente percebemos que as questões da conjugalidade mal elaboradas sejam prevalentes às questões da parentalidade quando o casal se separa, e isso ocorre para ambos os genitores.

Definitivamente não há uma única saída, uma única alternativa. Entendo que não somente é preciso cuidar e proteger as crianças, mas atentar para como as leis são executadas. Violência contra crianças e adolescentes é um dos tipos de violência mais frequente, e a prevalência é que a mesma ocorra dentro de casa. A questão definitivamente NÃO é uma questão de gênero, NÃO é culpabilizar genitores, NÃO é desqualificar leis já existentes, NÃO é transformar o psicólogo em um agente punitivo – pelo menos para mim, não deveria ser. Trata-se de DESENVOLVER continuamente ferramentas que possam proteger o direito da criança a se desenvolver em um ambiente salubre, especialmente do ponto de vista emocional – nesse caso da Lei da Alienação Parental – e o caminho sempre, SEMPRE, deverá ser através de uma conversa que dê voz a TODOS os envolvidos, com o objetivo único, volto a dizer: PROTEGER E GARANTIR O DESENVOLVIMENTO SAUDÁVEL DAS NOSSAS CRIANÇAS.

Esse é o lugar que entendo para o/a psicólogo/a: garantir através de seu conhecimento técnico-científico e uma postura ética, respeitando o Código de Ética Profissional, a escuta do sofrimento infantil e adolescente, para que assim os mesmos possam ser ouvidos, considerados e que se destine um cuidado qualificado a eles. Ou seja, não se trata de ocupar um lugar de agente a serviço do poder punitivo, mas de UM AGENTE DE SAÚDE MENTAL QUE DIALOGA COM OUTROS PROFISSIONAIS E ESFERAS SOCIAIS e se propõem a auxiliar através do conhecimento especializado.

Sugiro, acima de tudo, continuarmos a conversar e a trabalhar no combate a violência infantil, seja ela qual for!

Att.,

Psc. Dr.ª Bibiana G. Malgarim

Psicóloga Clínica, especializada em Psicoterapia Psicanalítica Infantil e Adolescente, Mestre em Psicologia Clínica e Doutora em Psiquiatria Ciências do Comportamento. Realizou pesquisas na área de abuso sexual infantil, trauma, resiliência e psicanálise. Apresentou vários trabalhos na área da infância e violência, publicou artigos científicos e publicou um livro sobre relacionamento pais e filhos frente a situação de separação e alienação parental. Contato: bmalgarim@yahoo.com.br .

 

OBS.: Essa nota foi publicada originalmente na página do facebook do Conversa de Gente Miúda.

Sobre a violência contra criança pelas lindas palavras da colega Luciane

“Hoje de manhã, indo para o consultório, eu escutava na Radio Gaucha – Ao Vivo uma entrevista com o delegado responsável pelo caso da menina Naiara, de Caxias do Sul. Ter contato com o relato foi me deixando triste e cada vez mais nauseada, com um nó no estômago e na garganta. Disse para mim mesma que não deveria estar ouvindo os detalhes sórdidos relatados pelo delegado, passei a imaginar as cenas, me colocar no lugar impossível e enlouquecedor da vítima. Se eu, adulta, psicóloga, fiquei deste jeito, não consigo nem alcançar o pânico e o sofrimento que esta pequena passou com seu algoz. O nó na minha garganta nela fez-se em gritos inaudíveis de socorro.
Todo relato de estupro e abuso mexe com a gente, é humano e natural, somos criaturas empáticas (alguns mais, outros menos). Mas o que mexeu comigo também foi escutar o delegado se referir a este crime da seguinte forma: “após a relação sexual (…) antes da relação sexual que ele teve com ela”. Bah, isso mexeu demais comigo. Não acredito que o delegado use estas palavras por mal, talvez ele nem se dê conta da forma como isso reverbera. Mas palavras têm poder, poder de significado, de dar sentido às coisas e guiar o modo como percebemos e compreendemos o mundo. O que o abusador teve com Naiara não foi uma relação sexual, foi estupro, foi abuso sexual, jamais relação.
Relação diz respeito a uma troca, por exemplo, eu tenho relações sexuais COM alguém, é entre, é uma troca em que duas pessoas plenas de suas faculdades mentais consentem em relacionar-se. Dentro desta linha de raciocínio, um estuprador não mantém relações sexuais COM sua vítima, ele, num ato perverso, subjuga a vítima, faz dela seu objeto de desejo, ele não estupra COM a vítima, não há relação, não há entre e muito menos troca.
Desfaço o nó na minha garganta escrevendo isto, de modo que as palavras possam ser repensadas e elaboradas, pois palavras são incrustadas de significado, guiando a forma como os fatos são compreendidos. O que podemos pensar sobre o sentido de usar o termo relação sexual, é que este termo traz consigo o significado de troca e consentimento, e no caso de um crime sexual o lugar da vítima pode ficar dúbio e questionável, como muito se vê em manchetes noticiadas pela mídia sobre estupros e abusos sofridos por mulheres, por exemplo.
Não existe relação sexual entre um adulto e uma criança pois isto é impossível, a criança não tem maturidade suficiente (psíquica e fisicamente) para se relacionar desta forma com ninguém. 
Dito isto, que sigamos transformando o luto em luta, sempre.”

Luciane David, publicado no Facebook dia 22 de Março de 2018.

Quando a Violência é Tudo

violência

 

Não há como uma criança sair ilesa de um contexto de vida no qual a violência – seja ela qual for – é o que dá tom das relações que ela tem. Não há como uma criança se safar de uma vida pautada pelo mau trato. Não há como imaginar que não haverá marcas, memórias, referências ou identificação quando a negligência ou o abuso (de qualquer ordem) estão constantemente presentes na rotina de um(a) miúdo(a).

Violência não passa com o tempo. Violência não se esquece. Violência não se ignora. Não se aprende com ela também.

Ao ler sobre relatos de adultos que hoje possuem uma série de dificuldades, como por exemplo, os que não conseguem estabelecer com o outro uma relação de alteridade ou uma relação que não seja pautada pela submissão, controle e agressão, não consigo deixar de pensar retrospectivamente em suas vidas: certamente marcadas desde bastante cedo pela violência – não preciso apostar nisso, infelizmente.

E quando tudo que se tem é violência, como ser outra coisa?

Bullying: Vamos continuar conversando sobre o assunto…

Apesar da palavra soar estranha ao ouvirmos, é um fenômeno muito comum. Quando vemos crianças ouvindo e tendo que conviver por muito tempo (anos) com “brincadeiras” e piadas a seu respeito, cada vez mais depreciativas e ofensivas, temos o que, então, chamamos de Bullying.

A palavra de origem inglesa, significa valentão, brigão e como verbo, significa ameaçar, amedrontar, tiranizar, oprimir, intimidar, maltratar. Desta forma, podemos entender que esse fenômeno é um comportamento agressivo e intimidador onde, em geral, uma criança é alvo de um grupo de colegas, os quais, repetidas vezes, amedrontam, oprimem, humilham e até agridem fisicamente a vítima do bullying.

Esse problema, que atualmente está sendo estudado e amplamente divulgado pelos meios de comunicação,  é passível de ser observado em qualquer escola – independente do tamanho da mesma, de ser pública ou privada – tem se tornado uma questão freqüente tanto para educadores quanto para os próprios alunos, contudo ainda percebemos muitos professores, pais e até os alunos acreditando que realmente se trata de uma brincadeira inocente.

O que pode ser visto por muitos como uma brincadeira “inocente” e “inofensiva” pode causar à vítima do bullying muito sofrimento e angústia, e pode acabar repercutindo de forma negativa no seu desenvolvimento. Os sintomas ou comportamentos apresentados são diversos, do isolamento a condutas agressivas, do baixo rendimento escolar a somatizações, além de problemas com sono, sociabilização e construção da identidade. Quanto à questão da identidade e do desenvolvimento, as vítimas do bullying são constantemente “minadas” e passam a viver com medo, dessa forma acabam por ter comportamentos que não são compreensíveis aos olhos dos pais e professores. Os apelidos, por exemplo, são as expressões mais comuns do bullying e encontrados quase que na maioria dos casos, embora possamos observar que esse comportamento tirânico pode chegar – e chega – a atingir a agressão física.

Salienta-se que, existem algumas diferenças entre as meninas e os meninos no que diz respeito à postura geral que adotam frente ao bullying, isto é, meninas, em geral, são muito mais discretas, suas mensagens são bem mais sutis, contudo não menos perversas, ou seja, as expressões do bullying com as meninas são feitas através de fofocas, maledicências e exclusões do grupo. Com os meninos o bullying é mais aberto em virtude de um comportamento mais externalizante como xingamentos e agressões.

Independentemente de meninos ou meninas, esse fenômeno é observado em grande parte das instituições de ensino e não pode mais ser um assunto marginalizado como os alunos alvos se sentem frente a isso! É importante ter claro que o bullying pode ter tanto expressões sutis e com certa facilidade contornáveis, como também chegar a atitudes extremas, principalmente por parte de quem sofre com a discriminação e brincadeiras maldosas.

É difícil imaginar o que pode vir a acontecer com uma criança que passe anos sendo submetida a situações de humilhação e constrangimento, entretanto acredita-se que seja uma experiência marcante a qual certamente deixará “rastros” no percurso do desenvolvimento da mesma.

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