Como se começa a viver? Em quais condições? Com quem se conta quando se entra no mundo? Quando um miúdo estreia na vida as pessoas do entorno são tão fundamentais quanto o ar que enche seus pulmões.
Um miúdo que conta com o olhar, cuidado, atenção e desejo de adultos terá um início privilegiado com toda certeza. Podemos imaginar uma cena facilmente: um bebê com vários adultos em torno, felizes com sua existência e absolutamente dispostos a fazer com que esse pequeno se sinta confortável na sua existência – adultos disponíveis para dar carinho.
Contar com um ambiente em que as ações mais básicas e fundamentais para um bebê sejam garantidas e fáceis para o miúdo – dormir, alimentar-se, sentir-se seguro – demanda muito esforço e uma constante disponibilidade por parte dos adultos que cuidam. É preciso para os cuidadores além de desejar, sentir que consegue cuidar.
Carinho: tão fácil e tão gratuito – como poderia faltar para alguns miúdos?
Falta porque, de fato, não é tão fácil, nem tão gratuito, muito menos óbvio. Em um contexto de dificuldades, tais como violência, vulnerabilidade, pobreza extrema, os adultos são tão afetados quanto os miúdos. Logo, como dar o que não se tem? O que não se consegue frente a fome e a insegurança que se sente no corpo e na mente?
No documentário “O começo da vida” (2016) há uma frase que julgo emblemática, que é mais ou menos assim: Não são as instituições ou projetos que cuidam de crianças, são pessoas que o fazem.
Não temos como considerar que todas as crianças tem um mesmo início, possuem as mesmas chances ainda que no começo da vida. A desigualdade começa tão precocemente na vida de muitos sujeitos que fica difícil escutar sem se incomodar frases feitas nas quais jaz a ideia absurda que ‘todos tivemos as mesmas chances, há quem as aproveita e quem não’.
Para cuidar de crianças precisamos de adultos que contaram com cuidados também – ou que podem passar a contar em algum momento.