Queria registrar sobre a Jornada do Ceapia desse ano a qual foi muito boa!
Com o tema As Exigências da Infância abordou desde questões escolares, relações parentais, tecnologia e a técnica psicoterápica, todas articuladas com o tema central. As falas das convidadas foram ótimas e destaco a primeira mesa de sábado, Discussão Clínica na qual foi apresentado um caso e discutido por duas psicólogas e psicanalistas, uma delícia de acompanhar!
Os Temas Livres, apresentação de trabalhos, também sempre é um ponto a ser destacado: valeu muito a pena, tanto em participar como poder escutar o trabalho dos colegas. Nesse ano, pude participar pela primeira vez como comentarista, atividade a ser realizada logo após a apresentação.
O tema que contemplamos foi a respeito da adolescência e suas inquietações esperadas ou não, perpassando pela discussão do corpo nessa fase, alienação e transgeracionalidade.
Abaixo, alguns pontos que escrevi e apresentei sobre o tema:
Autores defendem perspectivas diferenciadas sobre quando a adolescência começou: é um fenômeno pós guerra? Sempre existiu? Exemplo dessas discordâncias podem ser vistas nos textos de Calligaris, Levisnki e Jeammet, Corcos, por exemplo.
Demandas diferentes, intensas ou não, abusivas ou omissas, atuações ou o pensar em marcha, tudo isso incide sobre o corpo adolescente que se produz numa espécie de novo nascimento – contudo, um nascimento que parte de uma história com muitos capítulos, muitas vivências, muitos desejos interpostos. Além do corpo, há concomitantemente o processo identitário e alienante que também se encontram em cena. Com isso em mente, a música de Nando Reis me veio a mente, A Letra A:
“A letra A do seu nome
Abre essa porta e entra
Na mesma casa onde eu moro
Na mesa que me alimenta
A telha esquenta e cobre
Quando de noite ela deita
A gente pensa que escolhe
Se a gente não sabe inventa
A gente só não inventa a dor
A gente que enfrenta o mal
Quando a gente fica em frente ao mar
A gente se sente melhor”
Sobre o nome, entre em sua casa, pensa que escolhe? Justamente, introduziu-se para mim essas questões da alienação do adolescente, da relação com mãe-pai, da trasgeracionalidade.
Pergunto-me: rompe-se com as identificações alienantes? Trata-se de um desejo em relação a isso? Ou ainda, busca-se outras novas possibilidades de alienação? Vive-se sem alienar-se? Essas questões parecem-me que poderão ser desenvolvidas e elaboradas num processo esperado ou saudável de adolescer, uma vez que com a maturidade o sujeito percebe-se num axioma complexo de relações, necessárias e vitais, nas quais pode-se graus distintos de alienação emergem, sem necessariamente engolfar tudo o que há de ter de genuíno em um sujeito.
Constituir-se como sujeito diferenciado nessa etapa da vida é um processo muito difícil e delicado: é um jogar-se no vazio sabendo que há pessoas relevantes a lhe segurar e lhe trazer de volta – os pais, no caso. É um ir e vir, buscando a si de forma incessantemente inédita, entretanto , a delicadeza cabe exatamente que esse inédito é só uma forma de dizer, porque não é de todo, nunca será, não pode ser. Contudo, nesse momento de vida precisa ser vivido como tal.
Sem esquecer, claro, que a sensação do inédito está seguramente velada pelos olhos atentos das figuras de cuidado, as quais conseguem se afastar e se aproximar, tal como uma rede elástica de segurança que contém o corpo em queda. Essa rede de segurança – a qual não aprisiona, nem larga – em um desenvolvimento esperado vai se costurando e se adaptando naturalmente, quando isso não é possível devido a dificuldades na relação parental, talvez o processo psicoterapêutico seja o ambiente para essa confecção, a quatro mãos – ou seis, ou oito, se a mãe e o pai puder / quiser – amplificando as possibilidades e recursos psíquicos.
Parabéns a Comissão Organizadora e até ano que vem!