No jornal do dia 02 de fevereiro li uma resenha crítica sobre o filme “Precisamos falar sobre o Kevin” a qual trouxe considerações muito interessantes sobre o filme e pontos cruciais do mesmo. Contudo, coloca também que o “mal” (da maldade, perversão, etc.) pode aparecer em qualquer lugar, em qualquer lar, em qualquer situação, o que não é de todo errado, mas seria igualmente importante assinalar que para que um sujeito seja predominantemente mal é necessário pensar que houve uma história e um amplo caminho na construção psíquica desse.
Definitivamente o mal não surge do nada.
Fui ver o filme e nele esse desenrolar do nascimento de uma personalidade perversa aparece de forma angustiante: uma mãe profundamente ambivalente em relação a um filho e que, traça com ele e os demais familiares uma história de tristeza, frustração e dor. Narrado a partir das suas memórias e vivências atuais, Eva (mãe de Kevin) busca, a todo momento, genuinamente compreender o que se passa, entretanto não lhe é possível, de maneira espontânea, alcançar uma relação real, viva e vincular com seu filho.
O personagem materno sobrevive – em vários sentidos – a todos os ataques do filho (e que são muitos!) de forma heróica e toma para si, de uma maneira incomum e conformada, toda a avalanche precipitada por Kevin, sendo, em certo grau, secretamente cúmplice à obscuridade interna que se desenrola no filho. É interessante notar – e sentir – a relação que há entre essa díade e a palavra ambivalente não é suficiente para descrevê-la: ao mesmo tempo em que há claramente ódio e repulsa, há algo do plano do não dito e que é compartilhado de forma intimamente perversa por ambos.
A forma como o drama é narrado e as cenas são amarradas umas as outras oferece uma possibilidade extra para compreender como aquilo tudo pôde acontecer.
Não há resposta que seja suficiente ou completa para a pergunta “de onde vem o mal?”, mas sempre há uma história a ser contada, escutada e sustenta em cada um de nós.