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A Construção da Identidade do Jovem Psicoterapeuta (Parte II)

Texto dedicado aos colegas e alunos  da área  psi.

 

Continuando a pensar na construção do “ser psicólogo”, Zimerman (1999) aponta que há muito tempo que já não se crê na idéia de que os fenômenos psíquicos de um indivíduo estejam centrados exclusivamente nele mesmo e sim, na interação desse mesmo indivíduo com o meio e, conseqüentemente nos relacionamentos estabelecidos com os demais. Assim também ocorre dentro de um setting entre paciente e psicólogo (ou analista). Desta forma, como cita o autor, torna-se quase que unânime a afirmação de que o processo psicoterápico repousa sobre a dinâmica que há dentro do campo analítico, isto é, entre o par psicoterapeuta e paciente.

Para isso, segundo Zimerman (1999), existem pontos cruciais (“condições necessárias”) para que um psicoterapeuta (analista, segundo o texto) desenvolva de forma bem articulada o seu trabalho e constitua-se como tal. Ressaltando os pontos que parecem ser de suma importância, o primeiro a ser revisado diz respeito a formação do psicoterapeuta sendo que, ela está além da formação acadêmica e teórica necessária, ou seja, o psicoterapeuta deve estar munido de si mesmo e das possibilidades não previsíveis que cada paciente pode lhe propor dentro do setting e para isso existe a necessidade da psicoterapia pessoal e de supervisão.

O par analítico, outro ponto, traduz toda a delicadeza da relação que se dará de forma única entre aquele psicoterapeuta e o paciente, ou seja, a tonalidade de cada encontro e de todas as interações desse par.

Além das necessidades acima, existem outras como o respeito pelo paciente e seus limites, a empatia, a capacidade de ser continente, paciência, curiosidade sadia, ter claro para a importância a abrangência da identificação projetiva e da contratransferência, etc., todas essas são habilidades que devem aparecer em um psicoterapeuta e serem trabalhadas com a finalidade do seu trabalho ser suficientemente abrangente e capacitado (ZIMERMAN, 2004).

Ferro (1995) ressalta que, entre as diversas necessidades de um analista, a primeira é a de não poluir a mente de seu paciente e estar verdadeiramente disponível para ele. O autor coloca o quanto a situação interna do analista é algo fundamental no seu trabalho e, por isso mesmo, deve ser freqüentemente revisada e atualizada. Entretanto, não se pode esquecer que, segundo Ferro (1995), trata-se sempre de um par, ou seja, dois pólos e sendo assim não poder-se-ia isolar um do outro.

Diversas são as necessidades que existem para um analista, psicólogo ou psicoterapeuta e para Grolnick (1993) o “terapeuta estudante” deverá manter seu conhecimento psicanalítico mais ao fundo de sua mente para que próximo à superfície esteja a possibilidade de contato com seu paciente. O processo de “escavação” que ocorrerá dentro da análise ou da psicoterapia deve ocorrer, segundo o autor, com calma e o terapeuta deve ter claro que ele é um facilitador, não a força motriz e, dessa forma, tolerar que cometerá erros e sentirá sentimentos diversos às vezes (incluindo os negativos, como ódio, por exemplo).

Winnicott (apud Grolnick, 1993) coloca que o terapeuta bem preparado tem a possibilidade de movimento dentro dos níveis evolutivos e dos diagnósticos dos seus pacientes, ou seja, ele estaria aparelhado para lidar com pacientes que tenham sofrido profundamente. Entretanto, isso ainda não basta, o terapeuta tem que contar com uma boa capacidade de sustentar, manusear, ser criativo, ter tido algumas boas possibilidades de desenvolvimento e estudar, sendo que conforme Grolnick (1993) o fazer terapia é uma das formas mais eficientes de se alcançar alguns desses pontos.

Grolnick (1993) embasado no trabalho desenvolvido por Winnicott, cita:

… a técnica é ajustada ao nível de desenvolvimento do paciente e aos limites da compreensão do terapeuta. Quando precisam ser satisfeitas necessidades não-verbais, palavras em demasia e significados em excesso podem obstruir a compreensão. (Grolnick, 1993, p. 132)

 

O que o autor busca afirmar com a citação é a importância em evitar o erro de crer que o aspecto cognitivo da interpretação é de superior importância e que somente ele é que opera a modificação no paciente, antes ao contrário, a boa evolução do paciente em terapia (e na vida, como acrescenta o autor) se dá quando significado e sentimento estão o mais unido possível.

 

A literal construção de um psicoterapeuta já vem sendo discutida à longa data e notadamente mais aprofundada pelos estudiosos. Ironicamente, quanto mais se estuda, muitos outros pontos são avistados e exigem aprofundamento cada vez maior na formação de um jovem psicólogo. O que pode ficar razoavelmente claro é que, quando se fala em exigências não se refere simplesmente à formação acadêmica, inclui-se em igual importância a formação pessoal do psicólogo através de sua análise, da supervisão, sua prática e, por incrível que pareça, a capacidade de viver e possuir experiências pessoais.

Essa prática inicial indica ser sempre portadora de alguma ansiedade que por sua vez se torna útil na medida em que gera um movimento de busca pelo que falta. Outro ponto é o fato de que não é possível conceber que se terá um profissional pronto e amplamente acabado, logo não faz sentindo assorear-se correndo o risco de deixar vias importantes de entendimento entulhadas, ou, tomar-se de angústia pelo extenso caminho a ser trilhado no processo de formação e prática profissional.

Logo, a questão que parece muito relevante nesse momento é a possibilidade de submeter a teoria à prática e, em cima dessa última passar a construir algo que singularize o trabalho do profissional e acabe por dizer algo dele mesmo. Crê-se que isso é a busca pela identidade: procurar fazer do seu trabalho algo único e verdadeiramente seu, isto é, apropriar-se da sua prática. De fato não existem fórmulas – nem textos que dêem conta desse desafio –, existe sim um par que deverá se constituir e entre ele se dará a busca pelo tom único que marcará essa relação.

 

Referências:

Ferro, A. (1995). A técnica na psicanálise infantil: a criança e o analista da relação ao campo emocional. Rio de Janeiro: Imago.

Grolnick, Simon A. (1993). Winnicott o trabalho e o brinquedo: uma leitura introdutória. Porto Alegre: Artes Médicas.

Zimerman, David. (1999). Fundamentos Psicaníliticos. Porto Alegre: Artmed.

_____________. (2004). Manual de técnica psicanalítica – uma re-visão. Porto Alegre: Artmed.

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